Arquivo do dia: 19/04/2023

19 de abril para não esquecer Bolsonaro

Guilherme Silva*

Quinhentos e 23 anos depois, o dia 19 de abril nos obriga a lembrar de seres humanos que ainda não têm essa condição reconhecida. Em que pesem os avanços políticos de proteção dos interesses dos povos remanescentes, em 1500, desde Rondon ao governo Dilma Rousseff, o acesso à cidadania para eles sempre foi mais difícil.

O pouco construído, debaixo de muito sangue indígena, não foi apenas destruído pelo último governo. Ele adotou ostensivas e deliberadas políticas de extermínio de seres humanos, como se fazia com naturalidade, século 16. Não há outra expressão para elas senão genocidas. Bolsonaro garantiu que não demarcaria um cm² de território e deixou crianças yanomami morrerem da fome imposta pelo garimpo que ele autorizou.

O dia de hoje, nos obriga a contemplar o retrocesso causado pela ideologia da extrema-direita, também conhecida por bolsonarismo. Agropecuaristas, madeireiros e garimpeiros tiveram passe livre para avançarem selvagem e desordenadamente suas produções de altíssimos impactos socioeconômicos e ambientais, incentivados a matarem indígenas.

Crianças e mulheres estupradas e mortas, bem como várias lideranças que ousaram defender a casa e a família, além de povos e o meio ambiente poluídos e contaminados. O indígena faz parte da biota. Sem a floresta, ele morre, também. O mundo está no século 21, mas Bolsonaro retrocedeu o Brasil ao século 16, em um projeto genocida.

A data de hoje, exige uma incômoda, mas necessária reflexão acerca do atávico e cruel olhar dos bandeirantes sobre os povos originários, enraizado na sociedade. A classe dominante conseguiu produzir, em mestiços, a consciência de superioridade a partir da vista dos olhos azuis do invasor. Não importa a classe social ou grau de escolaridade, aos olhos destes, os autóctones são selvagens e inferiores.

Culturas e saberes tecnológicos de centenas de povos são tratados como pitorescos, coisas exóticas, atração de circo. Para o desespero dos progressistas e humanistas e, para a alegria da extrema-direita, em quatro anos, Bolsonaro quase destrói por completo cerca de 60 anos de alguns avanços políticos e civilizatórios.

Contudo, não teria ele tempo, muito menos competência para executar sua obra, não fosse a péssima consciência geral da população sobre essa minoria, com o apoio irrestrito de uma imprensa venal, que defende os interesses de seus donos no roubo dos recursos energéticos do país. Assassinatos, entre outros crimes, ocorreram na frente das câmeras, normalizados pelo mídia e sob o silêncio cúmplice da sociedade.

Muito além de combater e desfazer a nefasta política indígena do governo anterior, é imprescindível superar essa consciência abjeta. Isso é mudança cultural e não se faz do dia para noite. O governo Lula é progressista e deu um importante passo simbólico. O presidente subiu a rampa de braço dado com o mundialmente conhecido cacique Raoni Metuktire, de 90 anos.

Porém, o Congresso Nacional é tomado dos interesses dos três setores produtivos. Lula não tem o apoio necessário para estabelecer as justas políticas indigenistas, que devem ser de Estado, definitivamente. Não podem estar sujeitas à provisoriedade de governos. O apoio da sociedade depende do grau de compreensão que ela tem da importância dos povos originários.

À medida do amadurecimento dela, os povos que resistirem verão uma sociedade menos ignorante, mais respeitosa e aberta a se conectar a outras culturas. Até que isso aconteça, diante de um quadro cultural raso e frágil, nada está garantido, pois a classe dominante não descansa enquanto não voltar ao poder e destruir tudo, novamente. Portanto, 19 de abril, de 2023, se coloca como um hipopótamo atrás da orelha da sociedade, que aponta para o perigo de algum vacilo e o retorno da desumanidade, do genocídio das minorias. O dia do indígena impõe a indispensável atenção para não esquecer e impedir a vota do bolsonarismo. Viva os povos originários do Brasil.

*Guilherme Silva esrevinha