Guilherme Silva*
A audiência pública na Comissão de Constituição e Justiça, talvez a mais importante da Câmara, para a qual foi convidado o ministro da Justiça, Flávio Dino, confirma e reforça tudo o que disse o ator Pedro Cardoso, durante um falso debate armado por um canal noticioso da extrema-direita. Não obstante a infantilidade de 5ª Série, o maucaratismo da direita não conseguiu produzir um debate que justificasse o convite ao ocupado ministro.
Dino teve infinito e cansativo mais tempo que Cardoso e deu dezenas de aulas, das mais diferentes áreas do Direito. Educador diligente, o professor aplicou a devida pedagogia a uma 5ª Série fascista, que ousou admoestar um importante personagem histórico do nosso tempo, fazendo-o perder horas preciosas do trabalho de ampliar o acesso à justiça aos 215 milhões de brasileiros, para responder a parlamentares mal-intencionados.
Durante a sua apresentação, Dino pulverizou qualquer possibilidade de pergunta da oposição. Respondeu e desqualificou cada uma das interpelações dos parlamentares do clero subterrâneo. Portanto, não havia justificativa alguma para continuar a sessão, que durou cerca de três horas de repetições de perguntas e respostas, que o ministro e a Coisa Pública tiveram de tolerar. Um circo de pilantras armado pela extrema-direita.
Uma vez que os parlamentares insistiram pelo show, professor e juiz experiente e de grande envergadura, deleitou-se em tirar do sério criaturas sem qualificação para amansar burro no mato. Perdulários do erário, passaram estrondosa vergonha na CCJ, como sói à direita. Sem exceção, todos vestiram as carapuças que Dino, sutil e ironicamente, ofereceu às crianças que apresentavam, mais uma vez, do que são feitas. Todos os parlamentares se recusaram, solene e publicamente, a ouvir uma única palavra das aulas gentilmente ministradas por Dino.
Pedro Cardoso teve menos tempo de que o ministro e as circunstâncias foram outras, mas não foi menos incisivo. Ele colocou sal, pimenta, álcool e merthiolate na ferida, ao escancarar a profunda doença de que sofre o Brasil. Não há diálogo nos programas de auditório travestidos de jornalismo, não há interesse pelo pensamento do outro. É apenas uma sucessão de monólogos de cada participante do show, reproduzindo o que o dono da empresa quer dizer. Ao finalizar, Cardoso obrigou a CNN a chamar o próximo bloco. O ator perguntou aos jornalistas se eles são livres.
Dino escancarou situação similar. Durante três longas horas, que poderiam ter durado 20 minutos, poupado recursos públicos e a paciência de quem tinha o que fazer, o ministro respondeu às mesmas perguntas que o primeiro deputado fez, sem necessidade, pois o professor já havia explanado, com maestria, durante a abertura da Audiência Pública. O que variou, com invejável preparo técnico e político, foi o método de explicar para a criatura e aplicar a lição, deixando-a sem resposta.
Ao ministro não passou despercebido o desprezo dos parlamentares pelos seus argumentos, altamente qualificados. Mais sutil ou incisivo, Dino foi implacável com o cinismo dos fascistas que defendem os terroristas de 8 de janeiro e a ruptura democrática. Todos, de alguma forma, foram agraciados com a pedagogia do generoso professor. As assessorias dos deputados devem estar à base de Rivotril.
Ouvir o outro requer empatia, coisa rara hoje. Seja simplesmente pela descrença na humanidade e sua banalidade, ou má-fé, para estabelecer e controlar narrativas e reproduzir a ocupação dos espaços de decisão política. Ao fascista não interessa o que o outro pensa. Ou se é igual ou o outro é passível de ser eliminado. Seguiam em frente com a abjeta e odiosa propagação de mentiras e de ódio. Foi uma batalha campal, no cenário parlamentar, da qual o governo saiu fortalecido e a direita ainda mais desmoralizada. A Câmara, infelizmente, também.
O fim da Audiência foi o que se pode esperar da direita, desrespeitoso e patético. Sem argumento racional e informações verificáveis, a oposição provocou um tumulto que impediu o ministro de concluir suas respostas. Além da arrogância de convidá-lo para um debate inócuo e esdrúxulo, como ele bem qualificou, fica evidente, também, os péssimos caráter e educação dessa gente.
Infelizmente, o ministro jogou xadrez com pombos. Não sabem o que é Regimento Interno e ignoraram a civilidade. Antes de emporcalharem o tabuleiro e baterem asas, cometeram todo tipo de arbitrariedade e desrespeito à Constituição Federal, a quem juraram lealdade. A Audiência Pública serviu para, mais uma vez, demonstrar o hediondo preconceito desses parlamentares com as populações periféricas, o desconhecimento das leis e a tradicional má-fé dos donos dos poderes políticos e econômicos.
Guilherme Silva escrevinha